... Em sentimentos que envolvem o universo feminino, pois “Não se nasce mulher: torna-se.” (Simone de Beauvoir)
A dualidade de sentimentos que envolvem o Universo Feminino.

São tantos os sentimentos em busca da identidade feminina, cujos contratempos das emoções transbordadas vão do êxtase secreto à cólera explícita...

Esse blog é um espaço aberto acerca de relatos e desabafos relativos as alegrias e tristezas, felicidades e angústias... Sempre objetivando a solidariedade e ajuda ao próximo.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Mulheres que não esquecem suas dores...

"A dor da gente, não sai no jornal" Chico Buarque




Pela manhã recebi uma cliente num caso de divórcio. Uma bela mulher de 50 anos, porém com marcas evidentes de um sofrimento insuportável. Ouvir toda àquela história de ruína de um casamento de 24 anos, com riquezas de detalhes, me remeteu a minha própria dor da separação. Foi me dando um nó na garganta e principalmente, pela racionalização diante do caos emocional e de todas as consequências futuras que estavam por vir.

A consulta foi pesada e por mais que a encorajasse às atitudes necessárias, ela me parecia ainda não se dar conta do rompimento, a 'ficha não caiu' como usam na gíria a falta de percepção de que o marido não a amava mais e era um mau-caráter. Pois, da mesma forma que contava todo o sofrimento vivido, ainda pairava em sua fala uma esperança de que ele poderia voltar. Infelizmente, eu não tinha o poder de fazê-la enxergar a realidade porque ela não queria saber. Apenas, estava alí por imposição dos filhos.

Na hora do almoço, fui ao encontro de uma grande amiga que me esperava em sua casa. Quando cheguei, para minha surpresa, notei um semblante triste que foi cedendo lugar a uma alegria, através da minha presença e das borbulhas do espumante gelado dançando na taça de cristal. A minha manhã fora estressante e com recordações de dores latentes, então cedi ao escape do espumante para aliviar minhas lembranças desagradáveis.

O dia começa com duas mulheres cheias de emoções, uma com mágoas presentes e a outra com suas mágoas passadas, e se estende com a terceira, também na mesma situação da segunda. Então, dentre preenchimentos das taças vamos recordando nossas tristezas do passado até não suportarmos mais tantas dores sofridas. Mas, o álcool parece que vai amenizando nossas histórias revividas do âmago e das lágrimas escapulidas sem querer.

Já a noite, resolvo voltar para casa, depois tantas conversas e desabafos que me deixaram extenuada e vou cambaleante no trajeto, quando me deparo com outra amiga totalmente embriagada com o rosto inchado de choro, num bar nas proximidades. É a quarta mulher abandonada e cheia de dores pulsantes. De braços abertos ela me chama e com um abraço apertado se debulha em lágrimas me confidenciando ao pé do ouvido: “Essa dor nunca vai passar !”.

Sentei-me à mesa, transcorrendo pela madrugada, embalada pela fuga da realidade ao som das nossas gargalhadas catárticas alternadas ao pranto do sofrimento, cada uma carregando sua dor e anestesiando as angústias. Eis que, a dor não passa, nunca !

Numa pausa para o jantar...


'Eu estava cansada, muito cansada, com tantos problemas para administrar que não vi o quanto ele havia crescido e tentava alçar seu vôo sozinho em busca de novos afetos. 

Olhei aquele rosto com os traços do pai, mas ainda restava um pouco do meu brilho que antes era intenso e, agora, pouco a pouco desbotara pelas durezas daqueles tempos sombrios. Eu não imaginava que as dores do vazio paterno fossem o marcar tanto. 

Preocupada em defendê-lo das amarguras não vi que somente ele pode resolver essa falta, eis que não adiantava ser tão presente no lugar que cabe ao outro.

Seu olhar que antes era cheio de alegria se fixava agora no vácuo distante e seus lábios com inúmeras estórias a compartilhar se calava. Apenas, limitando-se a respostas curtas sem delongas. 

Tais efeitos, de um sofrimento tão desnecessário me irrigavam o rancor de vê-lo tão maltratado pelos efeitos da nossa solidão. Ele amadurecera pela dor e expressava suas angústias na desesperança.' 

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Apenas o silêncio...


"Quão melhor é o silêncio; a xícara de café, a mesa. Quão melhor é sentar-me sozinho como a solitária ave marinha que abre suas asas sobre a estaca. Deixem-me ficar sentado aqui para sempre com coisas nuas, esta xícara de café, esta faca, este garfo, coisas em si, eu mesmo sendo eu mesmo. Não venham preocupar-me com suas alusões a que é tempo de fechar a casa e partir. Eu daria de boa vontade todo o meu dinheiro para que vocês não me perturbassem, mas me deixassem ficar aqui sentado, para sempre, silencioso e só." Virginia Woolf 



Hoje, talvez por vários dias num tempo abstrato, não quero trabalhar, não quero falar e também não quero ouvir. O que preciso é ficar quieta e só, como uma ostra hermética às ondas que a tentam carregar. 

Não quero ver ninguém e ainda, não quero ser vista ou lembrada. Apenas, mergulhada em minhas angústias que me tomam tempo de demais para viver inteirada de tudo.

Antes, pensei que as informações mesmo que doloridas pudessem me libertar. Mas, não. Elas apenas servem para me arrastar cada vez mais ao sofrimento. 

Então, basta ! Deixem que eu tente pelo menos me adequar as tamanhas dores que sofro. Talvez, estas eu ainda consiga aguentar e quem sabe um dia me recuperar. 

Todas as outras dores que chegam me parece ser pesadas demais para suportar. E, me fazem perder a vontade da vida. Por enquanto, as que carrego permanecem junto com as lembranças de um passado não tão longínquo, em que vivi intensamente. 

 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Calada...


"Ofereça a outra face, ou seja, ficar calada diante da injustiça ou da desconsideração, é uma atitude a ser avaliada com muito cuidado. É uma coisa usar a resistência passiva como arma política da forma que Gandhi ensinou multidões a fazer; já é bem diferente o fato de a mulher ser incentivada ou forçada a se calar para poder sobreviver a uma situação insuportável de poder corrupto ou injusto na família, na comunidade ou no mundo. As mulheres nesse caso são isoladas da natureza selvagem, e seu silêncio não é de serenidade, mas representa uma enorme defesa para não sofrer violência. É um erro que os outros considerem que, só porque a mulher está calada, isso quer dizer que ela aprova a vida que leva.” Clarissa Pinkola Estes in Mulheres que Correm Com os Lobos: Mitos Histórias 
É no meu sofrimento que você está. 


Ocupando por inteiro o meu espírito cansado.
Se impondo sem dar espaço para as alegrias.
E, assim me sufoca toda a felicidade.

"Há sempre algo de ausente que me atormenta."
Camille Claudel



O silêncio da ausência...

"Os lugares que conhecemos não pertencem tampouco ao mundo do espaço, onde os situamos para maior facilidade. Não eram mais que uma delgada fatia no meio de impressões contíguas que formavam a nossa vida de então; a recordação de certa imagem não é senão saudade de certo instante; e as casas, os caminhos, as avenidas são fugitivos, infelizmente, como os anos." (Marcel Proust in 'Em busca do tempo perdido - no caminho de Swann')





Nunca mais o tilintar das chaves no início da noite soou aos meus ouvidos, pois Marcelo se dispersou em outros caminhos. Talvez, seja ele agora que anseia o som das chaves a espera de alguém. 

Dos novos sons compostos em músicas lançadas não eram mais compartilhadas entre nós. As misturas de palavras soadas na ansiedade dos debates não eram mais ouvidas. Os toques matinais e vespertinos do telefone foram silenciados. Até mesmo, os sons da concorrência desleal do jornalismo televisivo com as conversas no jantar não eram mais contestadas.

Nunca mais ouvi os sons da respiração ofegante em nossa alcova, dos beijos lascivos estalados, das risadas debochadas, do batuque das panelas no preparo das refeições, do quebrar da louça na pia ou do chamado carinhoso do meu apelido. 

Nem mesmo, os sons agonizantes dos roncos que me despertava dos sonhos, dos gritos coléricos de raiva ou dos escarros pela manhã havia mais. Apenas, uma lacuna jamais preenchida que me angustia o vazio. 

Assim, se deu os silêncios injustos e gritos mudos que me sufocam a alma.


terça-feira, 9 de dezembro de 2014

O engano...

"Muito poucos são os que não se deixam cair em nenhuma das reais tentações do aparente...  Sexo, poder e dinheiro são promessas vãs. Chegam a conjugar-se a fim de escravizar mais eficazmente quem parece amar a sua própria desgraça."  
José Luís Nunes Martins



Conhecia suas limitações, respeitava suas inseguranças, aceitava seus defeitos, tolerava suas raivas, apoiava suas escolhas e decisões, mesmo as não consultadas. Assim, Patrícia foi leal e cúmplice do seu parceiro.

Defendia-o com unhas e dentes de todas as injúrias impedindo qualquer humilhação, até mesmo pelos afins e parentes. Muito embora, desconhecesse a vida financeira de Julio, da qual não lhe era permitida participação, mas em todos os momentos ruins dos fracassos, lá estava ela, fiel sem titubear. 

Da vida social do companheiro, jamais pode participar dos eventos e quando inevitável, nunca era apresentada como tal. Assim, Patrícia viveu à parte, como se nada fosse de Julio.

Cuidadosa e admirada pelo o homem que amava, limpava sua pele, cortava suas unhas e comprava-lhe as roupas. Sempre preocupada com o bem-estar do parceiro. 

Um dia, ele se foi com a desculpa de quem precisava de nova parceira que o cuidasse melhor. Embora, partilhasse de todos os espaços que fora negado à Patricia, Julio aparenta maus-tratos. Pois, é visível que virou um coadjuvante e rasteja atrás das migalhas que lhe sobram.