"Refugio-me na loucura porque não me resta o chamado meio-termo do
estado de coisas comum." Clarice Lispector
Quando enlouqueci, nada mais fazia sentido. Não havia mais dia ou noite e nem horas ou minutos, tudo estava vagando lentamente sem que eu pudesse reagir. Então, me anestesiei daquela dor lancinante que arrebentava meu peito e esmagava minha cabeça. Já não tinha mais como suportar todo aquele sofrimento intermitente.
Não conseguia fazer mais nada, desde as mais simples atividades de higiene como escovar os dentes, me banhar ou trocar de roupa. Não me alimentava e nem bebia água, não dormia e não suportava meu reflexo no espelho. Era como se eu estivesse numa solitária da prisão, sem contato algum com ninguém.
Assim, vaguei sem rumo nessa escuridão até enlouquecer para sobreviver depois. Totalmente desamparada se abriu um vácuo profundo em minha alma. Já nem sabia quem eu era ou se estava viva. Esqueci minha maternidade, meus compromissos e responsabilidades, até a procura de um útero para me proteger sem encontrá-lo.
Hoje, sobrevivente dessa catástrofe emocional, percebo que o tempo foi longo levando toda a minha alegria. A dor não passa nunca, mas há mecanismos de suportá-la, apesar dos danos permanentes. Enquanto isso, meus algozes celebram a plenitude das injustiças sem o menor remorso.