... Em sentimentos que envolvem o universo feminino, pois “Não se nasce mulher: torna-se.” (Simone de Beauvoir)
A dualidade de sentimentos que envolvem o Universo Feminino.

São tantos os sentimentos em busca da identidade feminina, cujos contratempos das emoções transbordadas vão do êxtase secreto à cólera explícita...

Esse blog é um espaço aberto acerca de relatos e desabafos relativos as alegrias e tristezas, felicidades e angústias... Sempre objetivando a solidariedade e ajuda ao próximo.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Intrusão...


Confissões de culpa...



"O ego é dotado de um poder, de uma força criativa, conquista tardia da humanidade, a que chamamos vontade." Carl Jung




Não conter a vontade e transformar o desejo em ato sem previsão das consequências, pode gerar culpa. E, foi assim, que Julia cedeu aos encantos de Antônio, depois das tantas investidas e mensagens carinhosas de amor. 

Na sua tranquilidade da solidão exilada, de repente chega a mensagem: "Lindona, qual boa de hoje ?". Por mais que se desse silente, ele insistiu e Julia respondeu. Afinal, um drink regado de bom papo não era de todo mau. Até porque, Antônio era extremamente culto, inteligente, bonito, meigo e educado, todos os predicados de um homem dos sonhos, se não fosse pelo simples fato de ser compromissado. 

Pouco tempo antes, Julia teve um brevíssimo romance com Antonio, sem as vias de fato, de forma platônica, em que ambos estavam saindo de uma separação com seus respectivos pares. Julia apenas, serviu de conselheira e influenciou-o a retornar seu casamento, na intenção inconsciente que amenizar a dor do seu próprio fracasso conjugal. 

No entanto, a toda crise Antônio como um dependente emocional procurava Julia, se interessava em saber da sua vida e de uma forma ausente estava sempre se fazendo presente. Então, ela respondeu: "Você venceu. Me dê meia-hora que chego.

O tempo estava ameno, um vestido leve e suave, com acessórios artesanais, cabelos úmidos, um toque de lavanda, bastava para o encontro despretensioso nas redondezas do bairro. Mas, a noite hedonista regada aos destilados e marcada por assuntos existenciais foram suficientes para que Julia se encantasse novamente por Antônio, cujo discurso da conquista transbordava pelos olhos ternos e brilhantes daquele homem sensível e emocionado. 

A cada argumentação de Julia era correspondida com um olhar profundo e estático, como se ele estivesse embriagado ao som mântrico da sua voz mole. Em que não havia economias aos elogios despendidos, seja pela voz que julgava sensual, pela oferta de assuntos ou pela beleza endurecida da mulher que estava disposto a amar. Embora, houvesse divergências em pontos de vistas fundamentados, ele em plena sabedoria passiva lançava sua opinião na mais tênue elegância. 

No entanto, a admiração não bastava para que Antônio suportasse o desejo incontrolável pela mulher almejada.  De mansinho ele deslizava seus dedos suavemente na pele fresca do braço de Julia, até dedilhar os longos cabelos, os beijos miúdos pelos cantos da boca, os segredos ao pé do ouvido com os arrepios na nuca foram o suficiente para banir o super-ego de Julia e derreter todo o gelo de sua alma amargurada.

Já, não havia como controlar mais a vontade, então Julia o puxou contra o peito num arrobo inconsequente para um beijo molhado, entrelaçando as línguas cansadas dos discursos ao convite clandestino há tempos adiado. Ao caminho do refúgio, suas mãos dadas suavam de ansiedade, juntamente com as risadas intercaladas das músicas cantaroladas num ritmo desafinado na cumplicidade de ambos. 

Num ritual lascivo, Antônio vagarosamente desnudava a anatomia da amada, intercalando beijos módicos ao som de sussurros quase inaudíveis até tê-la completamente entregue. Na afeição simultânea dos olhos nos olhos, lágrimas eram sorvidas mutualmente até o romper das culpas com o descanso das almas paralisadas na fantasia novamente adiada.

E, assim um breve bilhete de Julia era pousado ao lado ausente da cama motivado pelo remorso: "Não podemos alcançar o nirvana, sem resolver as pendencias latentes que angustiam nossos espíritos. Estamos no lugar errado, na hora errada e no momento errado, contradizendo Chaplin... Enfim, não podemos regojizar a transgressão com a culpa, se não formos absolvidos. Obrigada, pela noite. Adeus".

domingo, 2 de dezembro de 2012

Filhos descartáveis...


"Foi concebido um varão, converta-se esse dia em trevas, que deus lá do alto não lhe dê atenção nem a luz sobre ele resplandeça, que dele se apoderem as trevas e obscuridade, que as nuvens o envolvam e os eclipses o apavorem." 
José Saramago in Caim



Ao adentrar na sala pela manhã trazendo as xícaras para o café da cozinha, pude ouvir um despertar esfuziante. - Bom dia, Mãezinha ! 

Animado para um encontro familiar, pude sentir o quanto ele ainda, clamava pela convivência com os irmãos. Na qual, era evidente a minha ausência e, mesmo assim, me comprazia com a sua felicidade e irmandade perante os seus.

No breve contato telefônico, de repente, vi na sua face um descontentamento tamanho, com seus lábios cerrando e num despenco convexo, seus olhos umedeceram opacificando o brilho do olhar de antes, desiludido e surpreendido por alguma negatória à expectativa, seu semblante se fez pesado. 

Bradando ofensas grosseiras, explodiu em ira pela imposição paterna da presença da atual companheira, antiga amante que retirara o genitor de casa. Agora, a predileção dos afins pela algoz, o tornara forasteiro dentro do outro lado familiar. A cada ato de abandono emocional do pai, após nossa separação e, pela notória preferência explícita aos demais os distanciavam mais ainda, tornando meu filho rejeitado. 

A presença ausente paterna, como apenas referência simbólica, roubou-o a leveza. Sua maturidade abrochou instantaneamente diante da impotência de lidar com a dor da perda, seu luto contínuo trouxera as mazelas do vazio existencial deixando-o rijo e amargo. 

Assim, meu rebento estava condenado a vagar na escuridão do deserto da alma. Esquecido e preterido, me sentia culpada pela má escolha genética. Sabia que sua presença atormentava o pai com a lembrança personificada de nossa união de outrora. Bem como, gerava perigo a nova escolha de vida.