... Em sentimentos que envolvem o universo feminino, pois “Não se nasce mulher: torna-se.” (Simone de Beauvoir)
A dualidade de sentimentos que envolvem o Universo Feminino.

São tantos os sentimentos em busca da identidade feminina, cujos contratempos das emoções transbordadas vão do êxtase secreto à cólera explícita...

Esse blog é um espaço aberto acerca de relatos e desabafos relativos as alegrias e tristezas, felicidades e angústias... Sempre objetivando a solidariedade e ajuda ao próximo.

quinta-feira, 4 de julho de 2019

Partida...





Eu ali parada no tempo e no lugar olhava para trás e o avistava reverso a mim. Sua imagem se distanciava cada vez mais às minhas súplicas. Olhava para frente e via a multidão de costas seguindo em frente. 

Minha visão estava turva pelo borrão da maquiagem que se derretia no jorrar do pranto. Estava tão absorta com a sua partida sem explicação que me senti completamente abandonada. 

Mirava novamente a retaguarda e já não havia mais sinal algum seu, que se esvaiu como a fumaça do meu cigarro dissipada ao ar. Na minha dianteira já não havia mais ninguém. 

Então, sentei no banco da praça e chorei mais ainda secando todo o sofrimento daquela perda até o cair da noite.

A raiva por sua partida me impulsionou continuar solitária até o trajeto de casa. Passei pelo portão rapidamente sem cumprimentar os vizinhos desocupados que esperavam seus familiares e adentrei pela porta dos fundos com vontade de quebrar tudo. 

Fui ao quarto e abri o seu armário tirando todas as suas roupas num rompante desesperado de ódio. Pensei em atear fogo, rasgar tudo, mas percebi que deixara somente as peças que o presenteei nas datas especiais. 

Sentei na beirada da nossa cama e percebi a aliança deixada sem cerimônia sobre a colcha. Nem se despediu, mas se desfez de todas as lembranças. 

Era covarde demais para enfrentar meus questionamentos sobre o rompimento. Mas, também não há explicação para o desamor. De repente, o sentimento se tornou pueril e sem motivos.

O ninho vazio..."

 
"A Dor da Saudade" - tela em óleo

Escuto as crianças em bando cantando e vou à varanda vê-las passar alegremente uniformizadas para algum evento extraescolar. Lembrou-me de você pequeno na volta da escola saltitante com sua mochila grande cheia de histórias em minha direção para o abraço apertado que apelidava de "upa!", ansioso para contar as novidades do dia na fala tatibitate quase inteligível com seus olhos brilhantes. Aí, você me entregava a mochila e pegava seu velotrol e saía pedalando pela praça se distanciando no limite do meu olhar até retornar cansado e irmos para casa. Aos finais de semana do verão o sol nos chamava para praia e caminhávamos de mãos dadas até a areia, quando você afoito soltava minha mão e corria em direção ao mar acelerando meu coração com medo da sua perda. Na memória fica sua imagem partindo com os cabelos cacheados castanhos claros esvoaçantes pela brisa marinha, mas eu pego você de volta e trago para junto de mim. Saudosa de sua infância me emociono por não ter mais no presente o abraço no fim do dia quando você chegava da faculdade. Agora distante pela geografia imagino sua volta da labuta do dia cansado sem a alegria da infância com a mochila vazia. A fase adulta nos furta a ludicidade da vida feliz trazendo a angústia do futuro incerto e, assim supro sua ausência pelas lembranças, já que não posso mais trazer você de volta para casa.