"... a mesma imagem que representa seu ideal é também o objeto de seu ódio” Lacan
Era tão contraditório a forma em que ele me tratava, ao telefone era gentil e sempre atendia minhas ligações com uma voz doce. Assim, mesmo após todo o sofrimento que amarguei com nossa separação, mantive ainda uma lembrança afetiva.
Já não havia mais rancores, apenas amor pelos laços familiares junto aos nossos filhos e pela generosidade de ajuda mútua. Mas, perante sua agressividade diante da minha presença, às vésperas dos dias das mães pude me deparar com o ódio dele.
Não havia motivos para tamanho descontrole perante uma opinião lançada, cuja falta de argumentos o fez me agredir com uma grosseria desmedida. Mantive-me absorta, sem qualquer reação à altura e constatei o quanto o ameaçava. Talvez, atrás do ódio permanecia uma insatisfação pelo rompimento mal resolvido que me causara tanta dor ou, talvez pela culpa que o assombrara.
No fundo tive pena dele, do seu envelhecimento precoce aparente, da infelicidade radiografada no fundo dos seus olhos e do tempo perdido num novo romance insosso. Pois, a nossa afinidade e alegria conjunta nunca mais voltaria, eis que por sua exclusiva insegurança recusou-se a manter nossa união. Vindo a perder o nosso futuro conjunto, reservado aos deleites familiares com nossos filhos crescidos e netos enchendo a casa. Porém, a escolha afobada de se aventurar numa nova união, desunida pela ausência de laços conjuntos, agora o castigava.
A data especial da maternidade, certamente o frusta por sua insensatez em viver mais solitário do que nunca. Quem sabe se seu ódio seja a representação da troca mal feita ?