"Privamo-nos para mantermos a nossa integridade, poupamos a
nossa saúde, a nossa capacidade de gozar a vida, as nossas emoções,
guardamo-nos para alguma coisa sem sequer sabermos o que essa coisa é. E este
hábito de reprimirmos constantemente as nossas pulsões naturais é o que faz de
nós seres tão refinados. Porque é que não nos embriagamos? Porque a vergonha e
os transtornos das dores de cabeça fazem nascer um desprazer mais importante
que o prazer da embriaguez. Porque é que não nos apaixonamos todos os meses de
novo? Porque, por altura de cada separação, uma parte dos nossos corações fica
desfeita. Assim, esforçamo-nos mais por evitar o sofrimento do que na busca do
prazer." S. Freud
Um calor insuportável, mais insuportável ainda na minha
condição de mulher madura em pleno climatério e pela dura situação de enterrar
mais um amigo de um passado vivido em bons momentos. Durante alguns anos evitei
encontrar com esse amigo que me ligava carinhosamente nas datas do meu
aniversário, mas eu estava tão adoecida de tristeza pelo meu divórcio que não
tinha condições de comemoração da vida. Ele insistia, e eu dizia que não conseguia mais, tudo havia perdido a graça. Apesar, das grandes comemorações de outrora rodeadas de amigos
no apagar das velas parecia que agora, eu estava condenada e
relembrar essas datas era muito doído para mim. Então, convencido ele concluía,
ano que vem comemoraremos.
Na tentativa desesperada de paralisar o sofrimento, talvez o decorrer do tempo distanciava ainda mais minha recuperação.
Na tentativa desesperada de paralisar o sofrimento, talvez o decorrer do tempo distanciava ainda mais minha recuperação.
Saí do metrô em direção à entrada principal do cemitério com
o sol a pino e caminhei longamente pelas alamedas observando os túmulos
pensando como a vida se esvai de repente. Tempos atrás, meus encontros com José
eram em épocas felizes e o ritual dessa passagem atual seria de dor,
com a saudade das boas lembranças que não voltariam nunca mais. Restando apenas o vazio.
Havia ainda, o encontro de outros amigos que me afastei e seria inevitável o julgamento do meu ostracismo. No trajeto, o remorso me espremia o peito por não ter atendido as tantas chamadas de José e dos outros, por não suportar lidar com a perda daquele passado em que fui tão feliz.
Havia ainda, o encontro de outros amigos que me afastei e seria inevitável o julgamento do meu ostracismo. No trajeto, o remorso me espremia o peito por não ter atendido as tantas chamadas de José e dos outros, por não suportar lidar com a perda daquele passado em que fui tão feliz.
Entro na capela, compro um buquê de flores, me dirijo ao
livro de presença e assino em meu nome e no nome do meu ex-marido, desaparecido
da minha vida e da vida dos nossos amigos. Chego perto do caixão e vejo o
rosto de José pálido e tão envelhecido, mas não há mais tempo de me
desculpar pelas faltas.
Olho ao redor e enfrento os olhares que me esperam corresponder e me surpreendo com abraços apertados dos amigos que não me esqueceram como eu tentei esquecê-los. Minha ausência nesses tempos, não lhes causaram rancor, apenas saudades e agora sou acalentada carinhosamente. Duas amigas, uma em cada lado, me dão os braços em solidariedade ao sofrimento e me direcionam ao jazigo aberto para enterrar mais uma dor. Parece que na tristeza em conjunto o golpe não machuca tanto.
O caixão desce e a terra o encobre, assim mais uma página da nossa história é guardada no arquivo da vida.
Olho ao redor e enfrento os olhares que me esperam corresponder e me surpreendo com abraços apertados dos amigos que não me esqueceram como eu tentei esquecê-los. Minha ausência nesses tempos, não lhes causaram rancor, apenas saudades e agora sou acalentada carinhosamente. Duas amigas, uma em cada lado, me dão os braços em solidariedade ao sofrimento e me direcionam ao jazigo aberto para enterrar mais uma dor. Parece que na tristeza em conjunto o golpe não machuca tanto.
O caixão desce e a terra o encobre, assim mais uma página da nossa história é guardada no arquivo da vida.
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